Tradução: Viomundo
Encontrei Pasi Sahlberg em dezembro
de 2010. Eu fazia parte da dezena de educadores convidados para visitar a casa
do cônsul finlandês em Nova York para saber mais sobre o sistema educacional do
país um dia depois do anúncio dos resultados de testes internacionais. De novo,
a Finlândia estava no topo das nações, como tem estado na última década.
Sahlberg assegurou aos convidados que os educadores finlandeses não se
preocupavam com os resultados dos testes-padrão e davam boas vindas aos resultados
internacionais apenas porque estes resultados protegiam as escolas finlandesas
contra os conservadores que exigem testes e resultados.
Os professores finlandeses, disse
Sahlberg, são bem educados, bem preparados e altamente respeitados. Recebem o
mesmo que os professores dos Estados Unidos em relação a outros profissionais
com diplomas universitários, mas professores finlandeses com quinze anos de
experiência em sala de aula recebem mais que seus colegas norte-americanos.
Perguntei a Sahlberg como era possível cobrar resultado de professores e
escolas se não havia testes padronizados. Ele respondeu que os educadores
finlandeses preferem falar em responsabilidade, não em obrigações. Ele disse,
“nossos professores são muito responsáveis; são profissionais”. Quando
perguntado sobre o que acontece com professores incompetentes, Sahlberg
insistiu que eles nunca conseguiriam emprego; uma vez professores qualificados
conseguem o emprego, é muito difícil demití-los. Quando perguntado como seria a
reação de professores finlandeses se fossem julgados a partir do resultado dos
testes aplicados em seus estudantes, ele respondeu “deixariam as escolas e não
voltariam ao trabalho enquanto as autoridades não abandonassem essa ideia
maluca”.
Sahlberg me convidou para ir à
Finlândia e visitar várias escolas, o que eu eventualmente fiz em setembro de
2011. Com Sahlberg como meu guia, eu visitei escolas bem iluminadas e alegres,
onde estudantes estavam engajados na aprendizagem de música, teatro, drama e
estudos acadêmicos, com intervalos de 15 minutos entre as aulas. Conversei
longamente com professores e diretores em saguões amplos e confortáveis. Livres
da obsessão com os testes que agora consome a maior parte do dia nas escolas
norte-americanas, a equipe tem tempo para discutir e planejar o programa
educacional.
Antes que eu deixasse a Finlândia,
Sahlberg me deu o livro chamado A melhor escola do mundo: Sete
exemplos finlandeses para o século 21 [The Best School in the World: Seven Finnish Examples from
the 21st Century], sobre a arquitetura de escolas
finlandesas. O livro é baseado em uma exposição apresentada na Bienal de Veneza
de Arquitetura de 2010. Quando visitamos uma das escolas que aparecem no livro,
eu pensei, como é gostoso descobrir uma nação que se preocupa apaixonadamente
com o ambiente físico no qual as crianças aprendem e os adultos trabalham.
Nisso, a Finlândia é uma nação
distinta. As escolas são cuidadosamente desenhadas para considerar as necessidades
acadêmicas, sociais, emocionais e físicas das crianças, começando bem cedo. Os
programas pré-escolares não são obrigatórios, mas abrigam 98% das crianças do
país. A educação obrigatória começa aos 7 anos de idade. Os educadores
finlandeses cuidam para não deixar as crianças para trás e evitam rotulá-las
como repetentes, já que estas ações provocam fracasso, diminuem a motivação e
aumentam a desigualdade social. Depois de nove anos de um currículo amplo, nos
quais não há julgamento por habilidade, os estudantes finlandeses escolhem se
querem uma escola secundária acadêmica ou vocacional. Cerca de 42% escolhem a
segunda opção. A taxa de conclusão é de 93%, comparada com cerca de 80% nos
Estados Unidos.
O programa de preparação de
professores da Finlândia está no centro da estratégia de reforma do sistema
escolar. Somente oito universidades podem formar professores e a entrada nos
programas de elite da formação de professores é altamente competitivo: só um em
dez candidatos é aceito. Não há formas alternativas de receber uma licença para
lecionar. Os aceitos obrigatoriamente passaram por treinamento em física,
química, filosofia, música e pelo menos dois idiomas durante sua vida escolar.
Os futuros professores passam por três anos de educação acadêmica e em seguida
fazem um programa de mestrado de dois anos. Os professores de determinadas
disciplinas precisam fazer mestrado naquelas disciplinas que vão lecionar, não
— como acontece nos Estados Unidos — em pedagogia ou em escolas especiais que
ensinam a lecionar. Todo candidato se prepara para ensinar a todos os tipos de
estudantes, inclusive com necessidades especiais e outras. Todo professor
precisa ter as duas formações, os três anos de faculdade e os dois de mestrado.
Como a admissão é difícil e o
treinamento é rigoroso, lecionar é uma profissão de respeito e prestígio na
Finlândia. O processo é tão seletivo e exigente que virtualmente todos os
professores são bem preparados. Sahlberg escreveu que os professores abraçam a
profissão com um sentido de missão e as únicas razões pelas quais abandonariam
a carreira é “se perderem sua autonomia profissional” ou se “pagamento baseado
numa política de mérito [ligado a resultados de testes] fosse imposto”.
Enquanto isso, os Estados Unidos agora fazem aos professores do país o que os
professores finlandeses achariam profissionalmente repreensível: julgar o valor
dos professores pelos resultados de testes aplicados em estudantes.
O currículo nacional da Finlândia em
artes e ciências descreve o que deve ser apreendido mas não prescreve detalhes
sobre o que exatamente o professor deve ensinar, nem como. O currículo requer o
ensino de um idioma nacional (finlandês ou sueco), matemática, idiomas
estrangeiros, história, biologia, ciência ambiental, religião, ética, geografia,
química, física, música, artes visuais, artesanato, educação física, saúde e
outros estudos.
Os professores têm grande liberdade
em cada escola para decidir o que ensinar, como ensinar e como avaliar o
progresso dos pupilos. Os educadores finlandeses concordam que “toda criança
tem o direito de receber apoio personalizado dado desde cedo por profissionais
treinados, como parte de sua educação”. Sahlberg estima que 50% dos estudantes
recebem algum tipo de atenção de especialistas nos primeiros anos de escola. Os
professores e diretores frequentemente discutem juntos as necessidades dos
estudantes e da escola. Como resultado desta política, Sahlberg escreve, “a
maioria dos visitantes à Finlândia descobre prédios elegantes repletos de
crianças calmas e de professores altamente preparados. Também reconhecem a
grande autonomia de cada escola: pouca interferência da administração central
da educação no dia-a-dia da escola, métodos sistemáticos para enfrentar os
problemas do dia-a-dia dos estudantes e ajuda profissional focada nos que
precisam dela”.
As crianças da Finlândia têm
importantes vantagens sobre as crianças norte-americanas. A nação tem uma forte
rede de seguridade social, paga com altos impostos. Mais de 20% de nossas
crianças vivem na pobreza, enquanto menos de 4% das crianças finlandesas
enfrentam o mesmo problema. Muitas crianças nos Estados Unidos não têm acesso a
cuidados médicos regulares, mas todas as crianças finlandesas recebem serviços
médicos completos e almoço grátis todos os dois. As universidades finlandesas
são gratuitas.
Sahlberg reconhece que a Finlândia
ficou de fora do que ele designou como “Movimento Global para a Reforma da
Educação”, que ele definiu com propriedade usando a sigla GERM [de Global
Education Reform Movement, germe em inglês]. O GERM, ele nota, é um vírus que
infectou não apenas os Estados Unidos, mas o Reino Unido, Austrália e muitas
outras nações. O programa No Child Left Behind do presidente George W. Bush e
o programa Race to the Top, do
presidente Barack Obama, são exemplos do movimento de reforma global. Ambos
promovem testes-padrão como a medida mais adequada para avaliar o sucesso de
estudantes, professores e escolas; privatização, na forma de transferência de
escolas para gerenciamento privado; currículos-padrão; e cobrança baseada em
resultados de testes, com o pagamento por mérito de professores, fechamento de
escolas com resultados ruins e demissão de educadores cujos alunos tiverem
notas baixas.
Em contraste, o objetivo central da
educação finlandesa é o desenvolvimento de cada criança como uma pessoa
pensante, ativa e criativa não obrigada a atingir resultados altos nos testes;
a estratégia primária da educação finlandesa é a cooperação, não a competição.
Vou avaliar a organização Teach for America — que aparece no livro A
Chance to Make History, de Wendy Kopp — em comparação com o
modelo finlandês em um segundo artigo.
Fonte: Vi o Mundo
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